Desdobra Dura


Eu pedi, como eu pedi! Deus, guie meus passos! Eu era uma menina, simplesmente. Eu pensava que amava, eu assistia as aulas vislumbrando os dias em que enfim estaria ao lado da pessoa que supostamente amava, sim, porque ele não interessa mais. E então apareceu aquele professor novo de filosofia. Olhem essa caixa, vejam, ele dizia. Eis aqui um mistério, ela não guarda nada e, portanto, poderia guardar uma infinidade de coisas, tentem ver o mundo de uma ótica diferente. Não sei se felizmente, ou infelizmente, eu estava tão aberta para qualquer sinal que meu “amado” pudesse dar que acabei entendendo o que o professor disse. E eu estava no meio, no meio do raciocínio. A caixa vazia era melhor que as outras caixas. Me deram um cutucão. Um bilhete, de quem ? Dele! Um quadrado perfeito, o começo de quase toda dobradura, ou desdobradura. Era um bilhete dele! “Eu te amo, me encontre no pátio da escola.” Eu deveria saber, eu não deveria deixar meus dedos soltos. Enquanto escutava a explicação, a caixa era como uma palavra, meus dedos, viciados em origami, fizeram uma caixa de papel a partir do bilhete. Em meio às dobras, ficou oculta a maioria das palavras, mas no fundo da caixa estavam como se fosse o que ela guardava. Eu amo.

Era o fundo da caixa, o seu conteúdo precioso, sua razão de existir. Eu amo. Aquela caixa estaria perdida, mas continha duas palavras, duas palavras que eram também caixas, mas eram traiçoeiras. Acho que são as duas caixas mais cruéis que pode existir. Elas te tentam à abri-las e, se você as abre, elas não existem mais. Pois é como se as abrindo elas se limitassem. Asa abrindo, asa abre, voassem. Tentei abrir a primeira caixa: eu. O conteúdo da caixa é a sua essência, que elas sequer sabem que carregam, são os ovos no ventre das galinhas. Pois bem, eu, toda definição que busquei foi insuficiente, foi limitadora, não consegui abrir a caixa, lembrei que as caixas vazias são superiores. Eu não era nada e por não ser nada poderia ser eu, e por poder ser eu, não havia conteúdo. Isso eu só imaginei, jamais pude abrir-me.

A segunda caixa foi minha danação. Também não consegui abri-la e então cheguei à conclusão que o que eu pensava de amor não era amor, nem poderia ser. E o que eu pensava de amor não valia um beijo, sequer. E eu não estava errada sobre o que era amor, mas ninguém estava certo. Que eu não fosse nada não mudaria muita coisa, nem famosa eu era. Mas o que seria do mundo sem amor? E o amor não podia ser nada! A palavra amor era a caixa que remetia a um conteúdo que jamais aquela caixa poderia carregar. A palavra carregava então o nada, e esse vazio era o que o mundo mais precisava, era a possibilidade do ... ! O que o mundo mais precisa é de nada? Pensei novamente no rapaz que gostava e tive náuseas. Tive nojo daquela massa rosa e pegajosa que eu pensava ser o amor, tive raiva das florezinhas e dos coraçõezinhos, dos beijinhos. Eu era tão racional que tinha me tornado sentimentalóide. Eu era tão racional que havia dado um nome e uma definição àquela preciosa caixa vazia. E descobri que ser extremamente racional ou sentimental era exatamente a mesma coisa. E descobri, que por aquele rapaz, eu não sentia nada de especial, eu racionalizei o que era amor e enquadrei o que sentia no que devia sentir. O que eu sentia por todo o mundo ..., o que eu sentia era uma caixa vazia.

Quando a aula acabou, saí indiferente, passei pelo pátio, indiferente. Era tanto amor que chorei.

Comentários

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