Cantares do sem nome e de partidas - Hilda Hilst

Sempre postei textos meus, mas alguns me matariam sorrateiramente durante a noite se eu não os compartilhasse. Esse é um trecho dos "Cantares do sem nome e de partidas" de Hilda Hilst, uma escritora fênomenal que é praticamente anônima na literatura brasileira porque nunca se adequou ao "mercado" que as editoras buscam. Deixo Hilda mostrar o que se pode fazer com as coisas para que não se justifiquem os que fazem menos delas em nome do lucro.

VII

Rios de rumor: meu peito dizendo adeus.
Aldeia é o que sou. Aldeã de conceitos
Porque me fiz tanto de ressentimentos
Que o melhor é partir. E te mandar escritos.
Rios de rumor no peito: que te viram subir
A colina de alfafas, sem éguas e sem cabras
Mas com a mulher, aquela,
Que sempre diante dela me soube tão pequena.
Sabenças? Esqueci-as. Livros Perdi-os.
Perdi-me tanto em ti
Que quando estou contigo não sou vista
E quando estás comigo vêem aquela.

VIII

Aquela que não te pertence por mais queira
(Porque ser pertencente
É entregar a alma a uma Cara, a de áspide
Escura e clara, negra e transparente), Ai!
Saber-se pertencente é ter mais nada.
É ter tudo também.
É como ter o rio, aquele que deságua
Nas infinitas águas de um sem fim de ninguém
Aquela que não te pertence não tem corpo.
Porque corpo é um conceito suposto de matéria
E finito. E aquela é luz. É etérea.

Pertencente é não ter rosto. É ser amante
De um Outro que nem nome tem. Não é Deus nem Satã,
Não tem ilharga ou osso.
Fende sem ofender.
É vida ferida ao mesmo tempo, "ESSE"
Que bem me sabe inteira pertencida.

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