Irideologia


As lágrimas. Seres ocultos, no fundo, do fundo, fundo. As gotas são serezinhos místicos que se unem em rituais de êxtase extremo, salgadas de dor, se lançam sem nenhum aval de seu hospedeiro. Jorram dos olhos que, embora úmidos, são indiferentes. Escorrem pelas maçãs surpresas de recebê-las e, então, morrem, se estirando na pele até ressecarem seu fluido. Fica o sal, fica a dor.

Íris. Como um grande tacho acobreado, íris marrom. Ornada de feridas, íris, como uma peneira de bronze, metálica, reflete o de fora e o de dentro. Espelho, maldito e bendito, da alma fugidia que não deixa transparecer bem se abriga. Íris, íris, olhos, que são o cinza do qual o mundo carece. A única alternativa sábia na escolha entre preto e branco.

Em vez disso, cinzas. Pólvora. E, muito longe, outra íris, outras lágrimas. Sal. O mar se faz o choro do mundo, e haja choro. O mar são os rios doloridos, salgados. O rio, indolor. Guanabara maldita de felicidade estúpida, mulatas, sol, barcos. Preto, branco, preto , branco. Passos garbosos, tranquilos. Tranquilos? Morros, íris, lágrimas.

Maresia, feita da dor alheia, refresca, alegra, sublima e corrói! Corrói! Luzes fortes, multidões, tapetes vermelhos, íris azul. Corrói! Olhos cheios d’água. Cheios e indiferentes. Sem dor, anestesiados, comedidos. Olhos cheios d’água, de lágrimas. Lágrimas que não se reuniram em êxtase nenhum, mas se foram, apenas para expulsar essa pérola do mundo.

Areia. Areia nos olhos. Corrói! A maior dor do mundo para uns. Banalidade pra outros. Vultos. Pés bem cuidados, tapete aveludado, pisado! E o que recebe, macio, os pés entorpecidos e sem dores sequer ajuda a aquecer o frio, maresia, dor alheia que penetra de verdade, fundo, se torna ...

Lágrima. Desoladas e recém nascidas íris, desoladas almas, desolados sais em êxtase que jorram. Tripas que fremem, vazias. Iris opacas, negras, secas. Inveja. Em seta, inveja. Flechas salgadas. Mãos, absurdas, cadavéricas. 38 milímetros de esquecimento, de berros. Saia daqui! Íris, silenciadas, agora silenciosas, faiscantes.

38 milímetros de descaso, de fome. Chumbo, seta de inveja e ódios e raivas que Deus já perdoou.

Íris vítrea. E em repetidas íris, luz. Luz azulada, manipulada, luz coleira:

-Morre hoje a cantora...com um tiro. Os disparos foram dados por um mendigo. As autoridades tentaram conter o tumulto, mas o mendigo foi linchado até a morte. O sepultamento da celebridade ocorreu hoje à tarde, e milhões de pessoas compareceram para ajudar a família nesse momento de dor.

Íris, novas, órfãs. Íris cercada de pequeninas veias dilatadas, íris. Vai um teco? Essa é da boa! Íris perdida.

Olhos cômodos, lendo. Íris...

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